Jan 25, 2008

Despedida

Ligado a uma máquina. A única maneira de te manter a respirar.

Era um dia especial. Levava-te um presente. Uma coisa feita por mim. Uma coisa para saberes que não me esqueço de ti. Para nunca correres o risco de te esqueceres de mim. Não me deixaram.
Não me deixaram entrar. Não me deixaram ver-te. Não me deixaram entregar-te o presente. Não me deixaram ver-te morrer. Não me deixaram ver os teus olhos fecharem. Não te deixaram veres-me sofrer.

Enganaram-se. Sofri mais. Sofro mais agora. Agora que me culpo por não ter passado mais tempo contigo. São tão poucas as memórias que tenho. São tão poucos os gestos, sorrisos, momentos que me lembro.


Não sei quantos dias passaram....

Deixaram-me em casa de alguém e sairam. Sairam e foram ao teu encontro. Despedirem-se de ti. Eles sim, tiveram a oportunidade de o fazer. Familiares, amigos teus, amigos dos familiares... menos eu. Ouvi as badaladas do grande sino no sítio mais alto da igreja. Ou talvez até não o tenha ouvido...

Terra é cavada. Mais um buraco foi aberto na terra, no meio de tantos outros, já ocupados. Ocupados por caixas grandes. Também tu foste numa delas. Um pano branco cobre-te o corpo. O teu corpo vestido por um fato que alguém achou o mais bonito. A tua cara branca, pálida, fria. As tuas mãos, os teus pés, os teus olhos. Já nada se movia.

As pessoas choram. Sofrem. E mais uma vez...eu não te vi. Voltei a não poder despedir-me de ti, caramba! Não te vi morto. Não pudeste ver-me a ver-te já sem vida. Pouco me lembro dos momentos que te vi com vida...


Passaram 7 anos, quase 8...


Já não te vejo. Já não tenho qualquer outra oportunidade de te ver. Agora já só poderia ver os teus ossos, ou o que restava deles. De ti.
Já não espero que abras a porta e me dês um beijo na testa e que me digas que tudo não passou dum sonho. Dum pesadelo.

Sofro mais agora. lembro-me mais agora. Sinto mais a tua falta agora. Já não te vejo. Já não te tenho. É raro o dia em que falo de ti. Mas também é raro o dia que não me lembro de ti.


Desculpa não me ter despedido de ti.

Tenho-me despedido das pessoas. De uma forma mais leve...Não vou deixar que não se possam despedir de mim, tal como aconteceu contigo.

5 comments:

Tiago Campos said...

Sei o que é perder alguém assim e não ter a oportunidade de me despedir, pois foi algo bastante repentino...
Vi a terra a ser cavada, vi a caixa descer... E apesar de ter visto ainda me custa não me ter despedido, frente a frente... E já passaram cerca de 10 anos...
Enfim, just to say que me identifiquei com isto.

Obrigado pelo comentário, e não precisas de saber o que dizer... O facto de teres gostado já me deixou todo convencido xP Thanks.

Tiago said...

Fogo, mesmo a calhar. :|
Já tinha saudades de visitar este espaço.
**

Tiago said...

Hey, muito obrigado. :)*

ContorNUS said...

Obrigado pela partilha...

As palavras descrevem exactas o sentimento!

Excelente

Anonymous said...

Há muito tempo que não chorava a ler alguma coisa...

...e desculpa hoje não ter dito nada. Depois falamos. Sou uma besta, talvez. Mas adoro-te. Pena nem sempre me lembrar disso. Adoro-te adoro-te adoro-te.